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quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Viagem a Carmona - Parte 3

O resto da viagem a Carmona não teve história. Pelo menos não me recordo de qualquer incidente ou peripécia eventualmente acontecida na parte final do percurso.

Lá chegados, fiz seguir o pessoal para o local onde os nossos carpinteiros trabalhavam, com a indicação de prepararem o regresso, carregando o material acabado e demais pertences. Pela minha parte fui apresentar-me ao Comando dando conta da minha missão e solicitar a indicação de um local onde pernoitar, visto não ser possível ter tudo pronto ainda naquele dia.

Foi-nos atribuído alojamento numa espécie de loja, de chão cimentado, de um qualquer edifício ocupado pelo Exército. Não estranhámos as condições, visto estarmos habituados a dormir no chão (1) e como vínhamos providos de rações de combate, tomámos uma rápida refeição e saímos para conhecer a cidade, dispersando-nos, enquanto a noite caía rapidamente.

Por muito que me pese, não tenho qualquer lembrança de Carmona. A impressão com que fiquei, e que, ainda hoje permanece, é a de uma cidade de nítidas características coloniais, sobretudo no que respeita às suas edificações. Pude, porém, aperceber-me do grande surto de desenvolvimento, à época, resultante, creio eu, da economia em período de guerra. Talvez por não ter levado comigo a máquina fotográfica, não possuo quaisquer fotografias de Carmona.

Deixo ficar aqui um vídeo, retirado do “youTube”, que já visionei várias vezes sem encontrar o que quer que fosse que despertasse a minha memória.



Deambulando pela cidade, eu e os dois ou três camaradas que me acompanhavam, acabámos por ir parar a um pequeno bar, onde, para surpresa e satisfação nossa, encontrámos uma das visitantes regulares do Tôto. Era uma das mais gentis, mas, permita-me quem me lê que me não demore na descrição das horas subsequentes. A sua alegria foi tal que insistiu em viajar connosco, no dia seguinte, de regresso ao Tôto. Assim sucedeu, disfarçada com um camuflado que alguém lhe arranjou. Os seus pertences vieram misturados com o diverso material carregado e a passagem pelo Vale do Loge – nova apresentação ao Comando – foi feita com o devido cuidado de se deixar longe das vistas o jeep em que viajava. Logo depois chegámos ao Tôto, mas o jeep só parou junto ao habitual alojamento, na fazenda do Sr. Cid Adão.

VETERANO

(1) Penso que dormi, durante a minha comissão, muitas mais vezes no chão do que, propriamente, numa cama. Uma ocasião, no Leste de Angola, em plena cidade do Luso onde nos encontrávamos em operações à ordem do Comando da ZIL (cujo estado-maior era, à época, chefiado pelo TenCel Craveiro Lopes, filho do ex-Presidente da República) foi-nos autorizado pernoitar no Grande Hotel. Pura e simplesmente não consegui adormecer naquele colchão, demasiado mole. Deitei-me no chão, ao lado da cama, onde dormi profundamente até à manhã seguinte.

V.

domingo, 26 de dezembro de 2010

CArt 3451 - Votos do Camarada Luis Cabral

COM VOTOS DE
E UM 2011 CHEIO DE SAÚDE.

AQUELE ABRAÇO DO LUÍS CABRAL - http://cart3451lucunga.blogspot.com/


Caro camarada Luis Cabral:
Em nome do pessoal do BArt 741 agradeço e retribuo os seus bons votos.

VETERANO

sábado, 25 de dezembro de 2010

Bom Natal 2010


Para todos

UM SANTO NATAL

Na impossibilidade de encontrar na net, para publicação, uma canção de Natal tradicional portuguesa, aqui fica um belíssima interpretação da mezzo-soprano Anne-Sophie Von Otter:
"Manhã de Natal"

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Votos dos Camaradas do BArt 2883

Do camarada Fernando David, do BArt 2883 (que também foi comandado pelo saudoso Coronel José Francisco Soares) recebemos a seguinte mensagem de Boas Festas:

Na pessoa do Autor do Blogue
desejo a todos os ex-militares do Bart.741
votos de Um Santo Natal e Feliz Ano 2011

Fernando David/Bart.2883

Por aselhice nossa, não fomos capazes de transferir, em tamanho adequado, a curiosa árvore de Natal, carregada de luminosos presentes, que anexou à sua mensagem.

Caro camarada Fernando David:
Em nome do pessoal do BArt 741 agradeço e retribuo os seus bons votos.

VETERANO

sábado, 18 de dezembro de 2010

Amores Rápidos

Um aspecto da "Sanzala Velha", o passeio da tropa, aos Domingos

A História de Humanidade é uma cronologia de conflitos. De início, pequenos grupos e, mais tarde, grandes exércitos, normalmente liderados por gente sedenta de poder e de riqueza, procuravam dominar-se uns aos outros. Multidões movimentavam-se de um lado para o outro, transformando-se, pela necessidade da conquista, em exércitos, não somente compostos por combatentes mas por um conjunto de heterogéneo de pessoas, onde as suas próprias famílias estavam incluídas.

À medida que estas multidões se foram especializando em exércitos de mercenários, nem por isso deixaram de ser acompanhados por um número importante de negociantes, artificies e vivandeiras (muitas vezes as próprias familiares dos comerciantes) que, entre outros negócios, exerciam também o da prostituição.

A prostituição, que sempre acompanhou os exércitos, criava problemas às altas chefias, devido, sobretudo, às numerosas doenças que propagava, a ponto de, muitas vezes, tornar inoperacionais unidades inteiras. Se, por um lado, a acalmia sexual proporcionada era benéfica para a moral do grupo, por outro, o inconveniente atrás referido tinha efeitos negativos sobre a capacidade bélica.

Muitos exércitos criaram, recorrendo sobretudo – mas nem sempre - às habitantes das regiões ocupadas, bordeis para militares, procurando gerir da melhor maneira aqueles aspectos. De qualquer modo, como é timbre da tropa, a iniciativa individual com mais ou menos risco e com mais ou menos êxito, lá ia resolvendo a questão.

Helena, a "amiga" dos militares, aqui numa festa tradicional!

A nossa Guerra do Ultramar não foi excepção. No Norte, onde as populações regressadas reorganizaram a sua vida junto dos aquartelamentos, não era para admirar que se estabelecessem relações de maior proximidade entre a tropa e a população. No Tôto, por exemplo, era ver, ao Domingo, toda aquela tropa de “ponto-em-branco” a passear pela sanzala velha…

O Tôto tinha, porém, uma particularidade que era a de receber, com determinada periodicidade, um grupo de mulheres, umas naturais da Província e outras, metropolitanas, que se instalava num alojamento alugado ao feitor do Sr. Cid Adão, proprietário da fazenda local. Depois…era o corrupio daqueles militares que, à custa de algum sacrifício nas “cucas” e “nocais”, tinham juntado o suficiente para o “affair”.

Algumas das visitantes eram particularmente bonitas e deixaram marcas no coração de alguns militares. Elas, pelo seu lado e em muitos casos, também não foram insensíveis à juventude daquela tropa!

Enfim! Embora rápidos, foram…amores!
Outro aspecto da "Sanzala Velha"

VETERANO

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Viagem a Carmona - Parte 2

Junto ao rádio de uma viatura de escolta. Em pé: SoldMecArmLig "Braga", SoldAt Freitas e FurMilInf João Mouga. Semi-deitado SoldAt Horta.
Repare-se nos óculos de condução (FurMil Mouga) e no lenço de pescoço

Verificada a inexistência de estragos voltámos à estrada e, a breve trecho, atingíamos o Vale do Loje, sede do BArt741 (e do Subsector B1). A paragem era obrigatória, a fim de me apresentar ao Comando e comunicar a razão da nossa deslocação.

Ora, como referi no postal anterior, isto passou-se na chamada Época do Cacimbo (ou Estação Seca) que se caracteriza pela quase completa ausência de chuvas, calor relativamente suportável – por vezes, à noite, fazia mesmo frio, obrigando a vestir a camisola de gola alta, de lã, que fazia parte do fardamento – grandes extensões de terra, negra da cinza resultante das queimadas do capim, e, sobretudo, muito pó!

De facto, uma coluna de viaturas, mesmo mantendo, entre elas, alguma distância, não evitava que, rapidamente, toda ela, homens e material, ficasse coberta de uma poeira avermelhada característica. Em melhores condições estava, evidentemente, quem viajava na primeira das viaturas, mas, nas restantes, era uma desgraça completa.

O pessoal defendia-se o melhor possível, usando óculos de condução, tapando parcialmente a cara com o lenço de pescoço – os Grupos de Combate haviam adoptado o uso de um lenço de pescoço, cuja cor identificava o Grupo. A do meu 4º GC era azul – indispensável sobretudo nestas deslocações.

Chegados ao Vale do Loge, tendo mandado apear e formar frente às viaturas, preparava-me para me dirigir ao edifício do comando para me apresentar, quando surgiu o nosso Comandante, TenCel Cabrita Gil. Apresentado o GC, interrogou-me sobre o destino da coluna. Expliquei-lhe que me dirigia a Carmona para recolher os carpinteiros que lá se encontravam deslocados e trazer o material para a nova sanzala. Respondeu-me que tal estava fora de questão, por duas razões: em primeiro lugar era demasiada gente para tal missão e, em segundo lugar, não permitiria que soldados seus aparecessem em Carmona no estado de sujidade em que se encontravam. “Olhe para isto! Veja bem! Aquele, ali, de bigode (era o Horta, excelente soldado, oriundo do Fundão, que usava uns fartíssimos e retorcidos bigodes, naquele momento completamente cobertos de poeira), parece que saiu mesmo de um aqueduto! Pelo menos metade, regressa ao Tôto”.

Com muita pena minha, tive que obedecer, apenas conseguindo, sub-repticiamente, fazer regressar uns quantos menos do que o Comandante pretendia. Pesaroso, o grupo designado lá voltou para o Tôto onde, tanto quanto me recordo, aguardou o regresso dos seus camaradas entregue ao trabalho de recolha da água e da lenha. Os outros, obviamente mais contentes, lá seguiram para Carmona.

VETERANO

domingo, 21 de novembro de 2010

Viagem a Carmona - Parte 1

A capelinha do Tôto
(Ao fundo, do lado esquerdo da foto, podem ver-se algumas casas da nova sanzala)

Um dia recebi ordem de me deslocar a Carmona (Uige).

Terá sido em meados de 1965 – talvez Junho ou Julho, ou até um pouco mais tarde – e, portanto, em plena Estação Seca. Queimados, há muito, os capins a terra começava a cobrir-se de novos rebentos aguardando a época de chuvas que se avizinhava.

Não me recordo quem comandava, por essa altura, a minha CArt 739, se ainda o Cap. Fernando Mira, se já o Cap. Morna do Nascimento. Fosse quem fosse, ordenou-me que me deslocasse com o meu Grupo de Combate àquela cidade, tendo em vista fazer regressar ao Tôto uns quantos soldados, carpinteiros na vida civil, que para lá tinham ido construir portas e janelas para as casas da nova sanzala. Com eles viria todo o material já pronto.

Constituiu-se a coluna com uma ou duas viaturas a mais – destinadas, precisamente, ao transporte dos “soldados-carpinteiros” e respectivo material. Aproveitando a circunstância para proporcionar ao meu pessoal um dia ou dois de férias – merecidíssimas, aliás, em virtude da intensa actividade exercida nos últimos meses - juntei todos quantos podiam deslocar-se e, no dia aprazado, lá arrancámos para Carmona.

Os trolhas

O meu condutor era, habitualmente, o Alonso Varudo, “o Compadre”, que sofria de aborrecidíssimas dores de estômago, pelo que a condução era, para ele, um verdadeiro tormento. Nunca se lamentava, porém, suportando com verdadeiro estoicismo a circunstância(1). Sempre que possível, e embora isso fosse expressamente proibido, eu próprio o substituía na condução do jeep(2), o que, daquela vez, acabou também por acontecer.

Para além do mais, a estrada era relativamente segura e assaz movimentada – pelo menos até ao Vale do Loge – por virtude de diversas deslocações de e para o Tôto onde se encontravam o Destacamento de Intendência, o Pelotão de Apoio Directo e o aeródromo com movimento de aviões pelo menos duas vezes por semana. Talvez por isso e que me lembre, nunca aquele troço de estrada foi atacado no ano inteiro que por lá permanecemos.

Já próximo do Vale do Loge a estrada fazia uma curva muito acentuada e, por isso mesmo, bastante perigosa. O “Compadre” bem me preveniu, mas, convencido da “excelência” da minha condução – aliás muito incipiente, pois nem carta possuía ainda – a verdade é que entrei na curva com algum excesso de velocidade – não muito, porque a estrada não dava para isso, mas, de qualquer maneira, com algum – e, por mais que tentasse, não consegui dominar o jeep, indo parar ao grande espaço que ladeava a estrada, cujo terreno, felizmente plano e sem árvores, impediu consequências mais desagradáveis do que uns quantos solavancos e um enorme susto(3).

Casas em diversas fases de construção
VETERANO

(1) O "Compadre" mantêm-se um excelente amigo e não podendo, por razões de saúde, comparecer às nossas confraternizações, nunca se esquece de me contactar telefonicamente por essa altura, para uma longa conversa, onde a saudade dos amigos transparece em todas as suas palavras.
(2) Deste modo fui praticando o suficiente para ainda, mas já próximo do fim da comissão, obter a carta de condução militar.
(3) Mais tarde, já no Mussende, protagonizei um novo acidente, desta vez com algumas consequências materiais, mas, felizmente, sem quaisquer mazelas pessoais.
Veterano

domingo, 31 de outubro de 2010

REGIMENTO DE INFANTARIA 8 - Braga - (Interregno - o Bart 741 continua em Novembro)

A PRAXE

Interrompo, uma vez mais, a sequência de postais relacionados com o BArt 741 pelas razões que, abaixo, aduzo. Regresso ao R.I. 8, ao início da minha vida como oficial (embora miliciano) do Exército Português.

Terminei o meu Curso de Oficiais Milicianos em meados de Dezembro de 1963. Nos últimos dias deste mês ou num dos primeiros de 1964, não me recordo ao certo, apresentei-me no Regimento de Infantaria 8, de Braga, a segunda das três Unidades que escolhera.Julgo que cheguei a Braga num Domingo, até à meia-noite do qual me deveria apresentar no Regimento.

Almocei num dos restaurantes da Arcada, onde me encontrei com um camarada que já se apresentara e que me pôs ao corrente do que lhe acontecera. Contou-me como fora obrigado a recolocar nos ombros as estrelas de cadete – no lugar do galão de Aspirante, que já levava – pois, segundo lhe dissera o Oficial de Dia, a sua promoção só era efectiva no dia seguinte - como fora “forçado” a efectuar a sua apresentação segundo o ritual das normas militares – em sentido e com as “Vossas Senhorias” da ordem, não podendo fumar sem solicitar licença e obtendo, com dificuldade, autorização para sair para comer alguma coisa, pois na messe – onde a cena se passou – não lhe ofereceram rigorosamente nada! Assim prevenido, retirei o galão – também já o havia posto – e, pelo fim da tarde apresentei-me no Quartel. Passou-se comigo exactamente o mesmo, com a diferença de que, sabendo da “coisa” procedi ao ritual com rigor – suscitando risos disfarçados dos presentes. Foi-me indicado o alojamento e, logo que possível, a ele recolhi.

No dia seguinte, logo pela manhã, todos os cadetes recém-chegados se juntaram à porta do gabinete do Major Magalhães – Director de Instrução – sendo, posteriormente, encaminhados para uma apresentação colectiva ao 1º. e 2º. Comandantes. Fomos informados de um programa de instrução em diversas matérias militares que iríamos frequentar naquela semana, antes de recebermos os recrutas do 1º. Turno de 1964. Autorizados a colocar o galão, iniciámos imediatamente o referido programa de instrução.

Todavia, a situação de frieza e de autoritarismo no relacionamento não abrandou: na messe, permanecíamos afastados dos restantes oficiais, só falávamos com alguém quando directamente interrogados, víamo-nos obrigados a pedir licença para tudo e mais alguma coisa – entrar, sair, fumar, etc.. Éramos tratados por “nosso Aspirante”, nunca pelo nome, e ninguém nos ligava rigorosamente nada.

A tal ponto, a situação era rígida e formal que já “conspirávamos” contra o sistema, maldizendo a hora em que tínhamos escolhido aquele Regimento.

Durou três dias, este estado de coisas. Três dias verdadeiramente horríveis, até que, antes do almoço do quarto dia, foi-nos ordenada a atenção para as palavras de um oficial superior – não me recordo já quem foi, se o nosso Comandante, Coronel Mota Freitas se o Major Magalhães - informando-nos de ter-se tratado da praxe em uso naquele quartel, de que éramos bem-vindos e de que, daí para diante, nos sentíssemos integrados no grupo, sub conditione de ficar, por nossa conta, o almoço daquele dia, obviamente, de “rancho melhorado”.

Permaneci em Braga até, sensivelmente, meio do ano, lá dando duas recrutas, até ser colocado no Regimento de Infantaria 2, em Abrantes, onde dei uma especialidade de Atiradores de Infantaria – por sinal a um grupo de soldados oriundos da recruta do RI 8. Aqueles pouco mais de 6 meses foram dos mais agradáveis da minha vida, sendo com profunda saudade que recordo esse tempo!

VETERANO

PS – Vieram-me à memória estas recordações após uma conversa com uma das minhas netas, recém-entrada numa das nossas Universidades, e submetida a todo um conjunto de actos de praxe, profundamente idiotas, pouco digno de quem os impõe e revelador de baixíssimo grau de educação e, sobretudo, de inteligência e de imaginação, qualidades bem necessárias a futuros doutores, mas que, para nossa e deles infelicidade, parecem possuir em reduzido grau.

Compare, quem quiser, as idiotices actualmente impostas aos jovens caloiros com a forma hábil e fina – quase diria, aristocrática - como fomos praxados em 1964.

VETERANO

Regimento de Infantaria 8 - Braga
Primeira recruta de 1964. Pelotão de Instrução. Ao lado do autor do bogue, os Cabos-Milicianos Sotto Mayor e Boanova

Regimento de Infantaria 8 - Braga
Primeira recruta de 1964. O autor do blogue verifica as armas, após a respectiva limpeza

Regimento de Infantaria 8 - Braga
Segunda recruta de 1964. Pelotão de Instrução. Não me recordo do nome do 2º. Sargento (à minha esquerda, na primeira destas duas fotos) nem do do 1º. Cabo que está ao seu lado. O outro 1º. Cabo era o Domingos. Nunca mais vi estes três militares que colaboraram comigo nesta recruta, salvo aquele Sargento que encontrei, bastantes anos mais tarde e por mero acaso, numa rua do Porto. Prestava, então, serviço no antigo QG da Região Militar, actualmente o Comando do Pessoal do Exército.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Soldado Artur Dias dos Santos! PRESENTE!


Artur Dias dos Santos, o "Palhaço"
44º. Aniversário da sua morte em combate no Leste de Angola
"Em verdade, só morremos verdadeiramente quando já ninguém nos recorda"

No Quartel do Lucusse a CArt 739 deixou esta "memória": um obelisco, relativo à Companhia, rodeado de outros quatro, mais pequenos e ligados entre si por uma corrente, cada um referente a um Pelotão.

Na base do obelisco central cravou-se uma pequena lápide metálica em memória do "Palhaço".

Na foto, os seus camaradas mais próximos: "SoldAtInf "Mano" e SoldApMet Dias, o "Palhaço Grande", que, com ele, completavam a esquadra de metralhadora pesada. À esquerda, o Furriel Mil Inf Carlos Alberto Ventura, Comandante da Secção.

"In Memoriam"
Uma velha canção militar alemã "Ich hatt' einen Kameraden" (Eu tinha um camarada)

domingo, 10 de outubro de 2010

A Leste Algo de Novo...Parte 3

No meio da "chana", já pela manhã, começa a levantar-se o acampamento onde se passara a noite. Note-se a colocação das viaturas, em circulo e voltadas para fora, de modo a acenderem-se os faróis, em caso de ataque noturno

As características da guerra no Leste de Angola eram, pelo menos no meu tempo, substancialmente diferentes daquelas que se verificavam no Norte onde, durante cerca de um ano, a CArt 739 havia actuado e adquirido experiência.

Para começar e no que à população respeitava, enquanto que, no Norte, a população indígena se refugiara nas matas – acabando, com o tempo, por se apresentar e concentrar-se nas cercanias dos aquartelamentos – e a de origem europeia abandonara as suas fazendas, no Leste não se verificava esse fenómeno.

O inimigo, por norma, não actuava contra os civis, embora esse receio subsistisse. Recordo-me de alguns patrulhamentos na área do Luso onde contactámos diversas povoações que encontrámos organizadas em auto-defesa, mas não tivemos notícia de incidentes. Apenas um caso, de alguma repercussão mediática, que foi o ataque a Teixeira de Sousa, pelo Natal de 1966, estava a CArt 739 já a iniciar a sua deslocação para Benguela, onde aguardaria o regresso à Metrópole.

Aqui, o autor do blogue dobra o seu colchão pneumático, preparando-se para partir. Reconhece-se, sentado no Unimog junto à "Breda" o SoldApMet Dias, o "Palhaço Grande"

A nossa deslocação para o Leste e aí colocados como tropa à disposição do comando da Zona (tropa de intervenção) deveu-se, segundo se constou na altura (escrevo de memória e não fiz pesquisa) à deslocação de uma unidade da guerrilha do MPLA na tentativa de evitar a hegemonia da UNITA, a única força em operações até à altura.

A população nativa convivia com as deslocações da tropa, não manifestava hostilidade, o que não era significativo sobretudo relativamente a eventual apoio que pudesse prestar ao inimigo. A actuação da tropa tinha, muitas vezes por base, informações fornecidas pela PIDE que exercia grande actividade na Zona.

Um Jeep no meio da "chana". Note-se a planura do terreno e a sua enorme extensão

Outra característica diferente era o terreno. Alternando com áreas de floresta de pequeno porte, viam-se grandes extensões de savana (chanas), muitas vezes impraticáveis devido ao encharcamento, onde manadas de elefantes se banhavam tranquilamente.

Dadas as enormes extensões das áreas de intervenção, enquanto que, no Norte, predominavam as operações apeadas, aqui eram frequentes as deslocações motorizadas que demoravam por vezes alguns dias até se atingir a zona de actuação propriamente dita, a partir da qual se irradiava em pequenas operações de “policiamento” nem sempre pacíficas.

Num aspecto estávamos melhores do que no Norte, já que recebêramos equipamento motorizado novo – Mercedes que substituíram as velhinhas GMC, Unimogs a gasolina e Jeeps novos em folha - para além de metralhadoras MG42. Desistiu-se da estrutura do Grupo de Combate adoptada no Norte e optimizara-se, tanto quanto possível a estrutura tradicional dos pelotões.

Uma Mercedes atascada.
Irá ser rebocada, por meio do guincho dos Unimogs, para local menos húmido
VETERANO

terça-feira, 21 de setembro de 2010

In Memoriam ---11 - Cel. José Francisco Soares

Faleceu, no passado dia 14, o nosso Comandante, o Coronel de Artilharia José Francisco Soares.
No dia 16, cerca da uma hora da tarde, recebi um sms do Cel Nuno Anselmo informando-me ter lido, no Diário de Notícias daquele dia a notícia do falecimento do nosso Comandante, o Coronel José Francisco Soares.

1965 - Vale do Loge

Fará, precisamente neste corrente mês de Setembro, 46 anos, que se constituiu, no RAL 1, o Batalhão de Artilharia 741. Mobilizado para servir no Ultramar por aquela Unidade, ali conheci o, então, Major Soares que substituía interinamente o Comandante TenCel. Cabrita Gil, que se encontrava em Angola.
Recordo, com grande precisão, o modo como foi sugerida a distribuição dos oficiais pelas diversas Companhias – os vários futuros Alferes escolheram o respectivo Capitão – modo este pouco usual, pelo menos até à altura, e, um pouco mais tarde, a sua insistência na instrução de tiro, bem como a imposição, praticamente diária, de treino de campo, reduzindo, ao mínimo imprescindível a actividade dentro dos muros do quartel.
Por razões de doença já aqui referidas, não acompanhei a parte final da instrução do Batalhão, nem a viagem para Angola, voltando, apenas, a revê-lo quando me apresentei no Vale do Loge, sede do BArt, vindo da Metrópole.
Durante o comissão o relacionamento com o Cel. Soares foi, obviamente, longínquo, tanto mais que, ao fim de cerca de um ano na Zona de Intervenção Norte, foram as Companhias espalhadas pela Zona Centro, todas elas muito distantes umas das outras. Apesar disso, foi, sobretudo, nesta última Zona, que o Cel. Soares desenvolveu intensa e notável actividade no sentido da fixação em Angola dos nossos soldados, muitos dos quais por lá ficaram a trabalhar nas mais variadas profissões.


1995 - Confraternização na Batalha

Uma maior proximidade verificou-se somente após o regresso do BArt por via das confraternizações que se seguiram. Sempre que lhe era possível – e quase sempre foi – nelas esteve presente. Teve sempre para comigo algumas frases de simpatia pelo trabalho e empenho na organização dos encontros anuais. E foi no fim de um desses encontros, que ouvi a frase que, quanto a mim, melhor define o Cel Soares: após se ter despedido de nós e afastando-se em direcção à saída, comentou, para mim, o Cel. Fernando Mira – ex-comandante da CArt 739 – ali vai um Homem Bom!
Recordo, com comoção, o dia em que, numa das conversas prolongadas que mantinha comigo naqueles dias de confraternização, se referiu a quanto lhe custara tomar a decisão de me castigar, em Angola. Por um lado, pelo bom trabalho que eu e os meus subordinados vínhamos desenvolvendo, e por outro, pela razão que me assistia na atitude tomada. Para quem não saiba, fui o único oficial que foi castigado no Bart 741 e a história conta-se em duas palavras.
Estando, um dia, de serviço ao quartel do Tôto, a um soldado, que não era do recrutamento inicial do BArt mas que lá havia sido colocado por castigo, recusei o pequeno almoço e expulsei-o do refeitório por atitudes incorrectas e indisciplinadas. O soldado queixou-se ao comandante da companhia e foi levantado o respectivo auto, até porque, como era meu dever, também participei a ocorrência. O inquérito concluiu, por um lado, pela indisciplina, sendo o soldado objecto de castigo e transferido para outra unidade e por outro, pelo excesso de autoridade, pois eu não poderia proibir quem quer que fosse de tomar a refeição a que tinha direito. Daí o castigo que me foi aplicado.
1999 - Confraternização na "Aldeia de Santo Antão"

2000 - Momento de recolhimento em homenagem aos camaradas falecidos

O Cel. Soares foi figura central nas nossas confraternizações, havendo sempre vários camaradas que me perguntavam, quando se inscreviam, se o Comandante estaria presente. Pelo meu lado, era sempre minha preocupação telefonar-lhe pelo Natal apresentando cumprimentos de Boas Festas. Compareceu, pela última vez em Viseu, no ano de 2007. Em 2008 telefonou-me, muito comovido, pedindo para transmitir a sua impossibilidade de presença, por razões de saúde.
E foi precisamente num desses contactos telefónicos natalícios que soube que o Cel. Soares havia caído de tal modo que batera fortemente com a cabeça. Fôra internado de urgência nunca, porém, recuperando totalmente as faculdades. Ultimamente, tanto quanto fui sabendo – telefonava com alguma frequência a saber do seu estado - vivia numa espécie de letargia, embora consciente.
2007 - Em Viseu. A sua última presença

Paz à sua alma!
VETERANO

sábado, 28 de agosto de 2010

In Memoriam ---10 - Eduardo Luís Pontes da Silva

Tomei conhecimento da morte do Pontes no dia 28 de Novembro de 2007. Falecera no dia anterior e o Catuna, camarada comum que, com ele, pertencera à equipa de Sargentos do 2º. GC, contactou-me telefonicamente. Sucedeu que me deslocara à Guarda, tentando resolver um importante assunto de um familiar próximo, sendo materialmente impossível deslocar-me até Azaruja a tempo de assistir ao funeral. Como lamentei não ter podido estar presente na última homenagem que os amigos do Pontes lhe prestaram!

Como atrás escrevi, o Pontes fazia parte do grupo de Sargentos do 2º. GC, grupo esse constituído logo no RAL 1 e sempre mantido uno e indivisível (salvo num pequeno período de tempo, lá para o fim da Comissão, em que o Catuna veio substituir, ao meu GC, o 2º. Sargento Santa), graças a um fortíssimo sentido de camaradagem, único na CArt.. Não sei se por todos eles estarem, de algum modo, ligados ao Sul de Portugal (o Pontes e o Cortes, oriundos do Alentejo, o Catuna é algarvio e o Palaio, embora nascido na Figueira da Foz viveu quase sempre no Seixal).

E é, precisamente, ao Eduardo Palaio que dou a palavra nesta pequena homenagem póstuma.

"Chegámos ao pátio, eu, o Catuna e o Cortes – o comando do 1º. Pelotão da cart 739 – conhecido, por nós, por Que Es Adof – puro latim."

"Só faltava o Pontes que, dolorosamente, era a razão da nossa presença."

"Estava tudo cheio de gente, dentro e fora de casa. Quem conheceu o Pontes sabe que amigos, dos verdadeiros, companheiros fieis, é coisa que lhe não deve ter faltado na vida, no trabalho, na terra. Estava lá tudo, as ruas começavam a ficar desertas: amigos de infância, de escolaridade, de trabalho, familiares…Os que o tratavam por Eduardo, os que o cumprimentavam por sr. engenheiro."

"Porque carga d’água sentimos, eu o Catuna e o Cortes que éramos nós, de entre a multidão enlutada, os “grandes amigos”?

Porque “caraças” achamos que, só nós, o conhecíamos!? Não aquele que foi parceiro de carteira da 1ª. à 4ª. classe, não o que nasceu no mesmo ano na Azaruja, não o que, com ele, partilhou as festas, os namoros, as farras, o canivete que cortou o chouriço e o queijo, os dias de caça, os estudos, não o que foi “às sortes” no mesmo dia. Porquê?"

"Pois, não faz sentido. “Mas quem o conhecia éramos nós, os camaradas da tropa. Quem mais foi abalado pela notícia fomos nós. Quem mais o podia abraçar…” E assim estivemos."

"Depois que regressamos no Vera Cruz, fez quarenta e um anos, encontrei-me com o Pontes umas dez vezes e sempre a partilhá-lo com um grupo. E só o conheci tinha ele vinte e um anos. Porque é que temos a pretensão de sermos nós os grandes amigos? Não por acharmos que ele viveu desde então escondido do mundo e sem mundo anterior, não por estarmos convencidos de que só a nós foi revelada a rara qualidade humana do Pontes, no meu caso, por me ter salvo a vida, mas, simplesmente, por termos estado juntos na guerra."

"Chega dizer: esteve lá connosco e ficou para toda a vida."

"Até logo Pontes. Ninguém morre, vamos partindo. O querido Pereira foi agora, também. Amanhã vou eu encontrar-te: damos uma volta pelo rio Vamba, tiramos o suor e o medo num mergulho na lagoa do Toto, tu cantas aquela, com a tua voz de trovão, eu vigio o lume do mesongué e ficamos os dois à espera do Catuna que é bom no merengue."

"Talvez a coisa se explique se eu contar o que, nesse mesmo dia, o também Eduardo, genro do Pontes, nos disse, corpo magro, cara pálida, olheiras fundas, com voz clara e firme: “eu quero ir ao próximo almoço”."

"PS. Quem conheceu o Pontes sabe que é impossível alguém sofrer mais a sua ausência do que a mulher, a filha e o nosso amigo e tão amigo dele seu genro. Perdoem-nos, às vezes querendo ultrapassar a dor, dizemos coisas destas."

Eduardo Palaio in Jornal do Bart de 2008

domingo, 22 de agosto de 2010

Mais Uma Emboscada

Ao centro, em pé: AlfMilInf Ed Palaio
Reconhecem-se: do lado esquerdo o SoldEnferm Manuel e, do lado direito, o SoldAtInf Varandas
Não identifico os restantes presentes na foto

No âmbito da Operação Confirmação que se estendeu, praticamente, por todo o tempo que a CArt 739 permaneceu no Norte, algumas foram as vezes que, por razões operacionais, dois Grupos de Combate actuaram em conjunto.

Por coincidência ou não, geralmente o meu GC saía com o 2º. GC, do AlfMilInf Eduardo Palaio, que, por ser mais antigo, comandava o patrulhamento, sem embargo de tomarmos, conjuntamente, as diversas decisões.

Uma delas passava, justamente, pela escolha do local das emboscadas – necessariamente nos trilhos usados pelo inimigo – procurando sempre, como é evidente, conjugar o maior número possível de factores favoráveis.

A fotografia documenta um desses momentos de ponderação, analisando-se a mata onde nos havíamos embrenhado, enquanto o pessoal aguarda ordens, aproveitando para descansar um pouco.

Não tenho especiais lembranças relacionadas com esta fotografia. Admito, pois, que, após uns dois ou três dias de espera, tenhamos desistido da operação e regressado ao quartel.

VETERANO

sábado, 14 de agosto de 2010

Aniversário

Há, exactamente, 45 anos, acabado de chegar, pelo meio da tarde, de mais um patrulhamento no âmbito da Operação Confirmação, assistia a um desafio de futebol entre as equipas de dois GC, quando se abeirou de mim o “Cifra”, de seu nome João Carvalho, bom e querido camarada dali dos lados de Penafiel, sempre presente em todos os nossos convívios, com um telegrama recebido por via rádio com a notícia do feliz e patriótico (14 de Agosto, dia da batalha de Aljubarrota) nascimento do meu primogénito, João.

Todo o GC se associou à minha alegria, improvisando-se, depois do jantar, um convívio na caserna das praças, que durou até às tantas e onde o excesso de álcool (ah! aquela 1920!!!) foi rei.

No dia seguinte, como era da norma, o GC entrou de serviço ao quartel. Pelas oito da manhã rendeu-se a parada e hasteou-se a bandeira, com toda aquela gente com uma ressaca de tamanho de um arranha-céus (a do “Bombeiro” durou dois ou três dias e precisou mesmo de assistência médica), incapaz de alinhar convenientemente, com fífias nas vozes de comando e, principalmente, no toque de continência que o “Clarim” nunca executou, tão mal, na sua vida!

João, aqui com 3 ou 4 meses

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Rex, o Cão de Guerra

O cão de guerra "Rex" e o autor do blogue

A "Operação Confirmação", tanto quanto me lembro, teve subjacente a intenção de limpar de elementos hostis toda a área da AIL que a CArt 739 recebeu quando se instalou no quartel do Tôto. Durante um número razoável de meses foram constantes os patrulhamentos a nível de Grupo de Combate, por vezes mesmo, a nível de 2 Grupos de Combate operando em conjunto.

Foi-nos cedida uma Secção de Cães de Guerra, composta, salvo erro, por 4 ou 5 cães e respectivos tratadores. Foi com naturalidade que cada conjunto se adaptou, melhor ou pior, a um dos 4 GC. O Rex, passou a sair, habitualmente, com o meu GC (ou mesmo com os pequenos grupos em que o GC se desdobrava), havendo sido de grande utilidade, em várias ocasiões.

Quero referir um curioso episódio de que este cão foi protagonista. Um dia, tivemos de fazer a travessia de um rio por uma “ponte” que não passava de um enorme tronco de árvore, habilmente tombado entre as duas margens. Passávamos em fila indiana, após as necessárias precauções de segurança. Com a tropa, passou também o tratador. O cão, que vinha solto, pretendeu segui-lo mas, a determinada altura do percurso, atemorizou-se e escarrapachando-se no tronco recusou continuar, apesar dos chamamentos do tratador. Começou a ganir de aflição, mas a verdade é que não se movia. Julgo que o tratador não sabia muito bem como resolver o problema. Acabei, eu próprio, por fazê-lo. Caminhando ao encontro do animal e, sentando-me no tronco, puxei-o para mim, segurando-o pelas patas dianteiras. Repetindo este movimento, fui recuando até atingir a margem do rio. A alegria do cão, mal se viu em terra firme, foi digna de registo e, em jeito de agradecimento, sempre que me via, manifestava a sua satisfação.
VETERANO

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Mussende Revisitado - Parte 3 --- A Caça

O autor do blogue e o SoldCond "Zé de Braga", à chegada às proximidades da lagoa aqui referida

Foi no Mussende que, pela primeira vez na minha vida, assumi a enorme responsabilidade de gerir, sob todos os aspectos – operacionais, alimentares, de saúde, de vestuário e tantos mais - o conjunto de pessoas que constituía um Pelotão. Não tinha qualquer tipo de experiência, pois não passava de um Miliciano de 23 anos que, até então, jamais se preocupara com semelhantes problemas. Estas questões, normalmente, apareciam resolvidas sem intervenção nossa, nunca tendo perguntado a mim mesmo como era que tal acontecia.

Contei, evidentemente, com a colaboração dos meus Sargentos, dentre os quais se destacava o 2º. Sargento Santa que, por ser de carreira, tinha toda uma experiência da burocracia do exército que a mim faltava. Todavia, a responsabilidade era minha, em virtude do meu posto e a idade atrás referida não era, obviamente, desculpa.

Vi-me, pois, na contingência de tentar obter localmente aquilo a que a terminologia da tropa apelidava de “recursos locais”, isto é – em teoria – deveria comprar, na povoação, aquilo que nos não era fornecido aquando das deslocações à sede da Companhia, para abastecimento. A título de exemplo refiro os frescos (hortaliças e fruta), carne e demais géneros de carácter facilmente perecível.

A carne foi, efectivamente, o mais fácil de resolver. Já no Tõto se criara uma equipa de caça que, com regular frequência, saía depois do jantar e que abastecia o quartel da carne necessária. Não era, de modo algum, uma situação autorizada, sobretudo por ser feita com a utilização de farolins que fixavam os animais para mais facilmente os abater, mas não era, também, abertamente condenada. Por um lado, devido à abundância de caça e, por outro, pela ausência de alternativa.

Carregando um antílope para o jeep, para o regresso à tenda

Dediquei-me, pois, à caça! Um civil, de que não recordo o nome, mostrou-me, um dia, uma enorme lagoa, rodeada de uma não menos enorme “chana”, onde não faltavam os mais variados antílopes – cuja carne era a mais apreciada. A carne da pacaça, animal igualmente muito abundante, tinha um certo gosto a capim, que a tornava enjoativa – onde ia beber uma manada de muitas centenas de animais (garanto que não exagero!). Era tão grande a manada que decidi, definitivamente, não utilizar o farolim, passando a caçar de dia e a pé. Quando chegávamos ao local, montávamos uma pequena tenda à frente da qual se acendia, à noite, uma fogueira para cozinhar a refeição e nos proporcionar algum aquecimento, pois as noites eram muito frias, por aquela época. Partíamos de madrugada, aproveitando, muitas vezes, o despertar dos animais, abatiam-se duas ou três peças, e um de nós regressava à tenda para trazer o jeep necessário ao transporte da caça abatida.


SoldApMet Dias o"Palhaço Grande" a caminho da tenda com uma peça abatida

O desmanche das peças já iniciado.
Reconhecem-se: SoldCond Alonso Varudo, "Compadre", SoldApMet Dias, 1º.CaboAt Manuel Pereira, "Bigodes" e um dos nossos cozinheiros, cujo nome não recordo

A Tenda
Reconhecem-se: SoldCond "Zé de Braga" e SoldAt Manuel Santos, "Bombeiro"
À esquerda pode ver-se o civil que nos indicou este magnífico local de caça (trata-se do Sr. José Bento, já aqui referido pelo seu Genro, o Sr. Francisco Fonseca)

VETERANO