O Mussende, nos dias em que lá não parava a carreira de Nova Lisboa, era uma pasmaceira! Executados os diversos serviços – lenha, água, limpezas, etc. – normalmente acabados ainda antes do almoço, o calor abrasador da tarde convidava ao descanso nas tarimbas, ou a uma cerveja fresca no café do Leitão, porque pouco mais se poderia por lá fazer. Quando havia viaturas em condições, saía um jeep em patrulha, pelos arredores.
O Mussende era uma pequena localidade num cruzamento de estradas. Há muito tempo já, que por lá se haviam estabelecido “comerciantes do mato” (julgo que era este o nome que se lhes dava) cuja actividade consistia na compra, ou melhor, na troca, já que se não negociava a dinheiro, dos produtos indígenas por panos e outro tipos de mercadorias que os locais apreciavam.
Numa dessas tardes de modorra, ao chegar ao quartel, alguém me disse – se bem me lembro, foi o “Porto” - para ir ver uma “prenda” que por lá aparecera. Tratava-se de um pequenito mulato, magríssimo, que, segundo me contaram, havia sido encaminhado para o quartel pelos habitantes de uma sanzala onde havia sido abandonado pelos pais – um “bóer” e uma indígena – antes de partirem para Luanda.
Toda a tropa o rodeava e puseram-se a insistir comigo para que o recolhêssemos. Ordenei que, para já, lhe dessem alguma comida, visto aparentar fome. Assim fizeram e ele não se fez rogado. Após comer, deitou-se a dormir e para ali ficou mais de um dia, qual jibóia, a digerir o alimento.
Decidiu-se, democraticamente, que a criança ficaria ao nosso cuidado, desde que alguém se encarregasse, efectivamente, de velar por ele. Logo se ofereceu o “Japonês” e o pequenito passou a viver no nosso quartel. Via muito mal e, por essa razão, caía com frequência. Melhorou bastante com a alimentação que passou a ter, mas, em contrapartida, fartou-se de aprender “linguagem de caserna” que usava com a maior das inocências.
Como ninguém sabia o nome dele, alcunharam-no de “Atraso de Vida”.
Quando nos deslocámos para o Leste, acompanhou-nos, como se, sua família, fôssemos. Ficou recolhido na Casa do Gaiato de Benguela aquando do regresso da Companhia à Metrópole, em 1967. Se ainda for vivo, terá hoje, à volta de 50 anos e eu, confesso com alguma comoção, que gostava muito de saber do que foi feito dele!
VETERANO
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