Teve, por Unidade mobilizadora, o Regimento de Artilharia Ligeira 1, de Lisboa. Constituído por três Companhias operacionais e uma de comando e serviços - C.ART 738, C.ART 739, C.ART 740 e CCS - desembarcou em Luanda no dia 18 de Janeiro de 1965. Regressou à Metrópole em 1967, aportando ao cais da Rocha do Conde de Óbidos a 9 de Março.


quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

A Caminho do Norte - Diário de Viagem - Parte 2

Segundo Dia: Quibala-Norte - Quartéis de destino

Retomámos a viagem no dia seguinte, e o que mais me chamou a atenção foi o elevado número de sanzalas abandonadas e completamente destruídas. Numa das paragens para distender as pernas e outros alívios, abordei o assunto com um dos condutores dos camiões, afirmando, num misto de ignorância e ingenuidade, a minha revolta pela destruição "que os sacanas dos turras tinham provocado na zona, despovoando-a". Para minha surpresa, ele disse-me que a destruição era obra da Força Aérea para evitar que se tornassem abrigo do inimigo.
Chegados ao Toto, destino final da CArt 739, as outras unidades do Batalhão separaram-se. A CCS e a CArt 740, seguiram para o Vale do Loge e a Serra da Inga, e nós seguimos para Lucunga.


Quartel do Tôto

Parámos no Bembe, onde estava uma Companhia de Caçadores e poucos quilómetros depois chegávamos à Missão do Bembe, onde já não havia missionários. O edifício onde eles habitaram durante muitos anos, tinha-se transformado no quartel da Companhia de Caçadores 715, que nos tinha preparado uma inesperada, mas muito agradável recepção. À nossa espera estava uma longa mesa, posta com comida e bebidas para reconforto dos nossos estômagos, há dois dias a ração de combate.

Missão do Bembe

A forma hospitaleira como fomos recebidos, marcou-nos profundamente e, foi o princípio de uma de uma amizade que nalguns casos ainda se mantém. Por exemplo, a foto da Missão que ilustra este texto, foi-me enviada pelo antigo furriel-miliciano Carlos Cristóvão, daquela Companhia.
Duas horas depois, ao anoitecer, chegámos ao nosso destino.
Na prática o "quartel" de Lucunga era constituído por quase todas as moradias da povoação (que tinham sido abandonadas - e muitas destruídas - em Março de 1961), que se estendia por algumas centenas de metros ao longo da estrada.

À primeira impressão parecia um lugar simpático. Mas sobre isso espero poder "falar" no futuro. Afinal, só queria escrever sobre a viagem..."

Carlos Fonseca

CArt 738

sábado, 23 de janeiro de 2010

A Caminho do Norte - Diário de Viagem - Parte 1

Primeiro Dia: Luanda - Quibala-Norte

A nossa partida de Luanda para o Norte teve lugar na manhã de 23 de Janeiro de 1965.

Sabíamos que o nosso destino - no caso da Cart 738, era Lucunga - seria, previsivelmente, menos perigoso que Zala, Nambuangongo, ou qualquer local dos Dembos, mas tinhamos a cabeça cheia de relatos feitos em Luanda por camaradas mais antigos, que nos falavam de emboscadas, minas nas estradas/“picadas”, armadilhas, etc., que diziam ser frequentes naquela zona.

Partimos - tendo como meio de transporte uma coluna de camiões de reabastecimento - com um misto de ansiedade e apreensão pelo que nos esperava. A primeira paragem teve lugar na localidade do Caxito, já a norte de Luanda, onde muitos habitantes aproveitaram para nos vender cocos, bananas e outros frutos, e que serviu para descontrair um pouco.

Já perto da hora do almoço, passávamos num local em que a estrada se “afundava” entre duas encostas densamente arborizadas, quando foi dada ordem de paragem, para fazermos um primeiro contacto com a mata angolana. Cada secção recebeu ordem de entrar em determinada zona da mata e avançar em patrulha.

Não estava prevista esta acção e o receio daquele primeiro contacto com o que julgávamos ser algo parecido com a realidade que nos esperava, assustou. O medo era tal que não consegui que a progressão se fizesse de acordo com os manuais, e o mesmo se passou com a maioria das secções. Enquanto comandante de secção devia ir no terceiro lugar da fila, mas a verdade é que não consegui que alguém avançasse à minha frente. Quando eu parava, paravam todos. Pareciam pintos à espera que a mãe galinha indicasse o caminho.

Naturalmente, a ideia da entrada na mata não passava de um exercício que não oferecia qualquer perigo, mas quem é que acreditava nisso? O cenário era um pouco assustador. Mas era só cenário.

Em muitas zonas o caminho era ladeado por árvores que desconhecíamos e que nos informaram chamar-se mangueiras, cujo fruto era a manga. Numa das paragens experimentámos colher e comer esses frutos. No que me toca, achei que a manga, com o seu paladar tão especial, devia ter feito parte do pomar do Paraíso.

Ao fim da tarde chegámos a Quibala-Norte, onde iriamos pernoitar.

Quibala-Norte: o aquartelamento

O quartel, constituído por edificações prefabricadas, de madeira, situava-se num local isolado.

Dormi, tal como aconteceria na primeira semana, em Lucunga, num desconfortável "burro" de campanha. Tratava-se de uma armação com pés em cruz, dobráveis, sendo a "cama" constituída por uma lona que se fixava à armação. Nalgumas zonas do Brasil é chamada "cama de vento". Em Portugal era muito usada nalguns dormitórios da C.P e chamavam-lhe "cama-volante".

(Continua)

Carlos Fonseca

CArt 738

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Faz hoje 45 anos!...


Almeida, Fonseca, Babo, Miranda Dias e Mourão

Depois de nove dias de viagem, o navio Vera Cruz atracou no porto de Luanda ao princípio da manhã de 18 de Janeiro de 1965.

Depois das emoções da despedida a viagem decorreu – tanto quanto me recordo - sem episódios dignos de registo. Os oficiais e os sargentos, viajaram confortavelmente, instalados em 1ª e 2ª classes, respectivamente. Já no que respeita aos praças, as acomodações eram menos confortáveis, sobretudo para os que, não tendo lugar nos já de si apinhados camarotes de 3ª classe, se viram obrigados a dormir em beliches, instalados em tudo o que fosse espaço vago, incluindo os corredores.

Na 2ª classe, não só tínhamos boas acomodações, mas também usufruiamos de um serviço quase luxuoso. As refeições estavam ao nível de um hotel de quatro estrelas, incluindo pequeno almoço à inglesa e um lanche de se lhe tirar o chapéu.

Às cinco da tarde abria o bar, onde podíamos escolher toda a espécie de bebidas, incluindo cocktails que a maioria de nós só conhecia da leitura de romances.

Ao serão podíamos assistir, numa noite, à projecção de um filme, na seguinte, à exibição de um conjunto musical (fracote). Quer um, quer outro espectáculo tinham lugar alternadamente na 1ª e na 2ª classes.

A parte menos simpática tinha lugar a seguir ao almoço, altura em que, ao toque da sereia do navio, tinha lugar um exercício de salvamento, que terminava sempre com o pessoal a cantar a célebre “Angola é nossa” (e a maior parte dos “passageiros” pensava que Angola era mesmo nossa. Afinal era engano...).
Paquete Vera Cruz - Salão

O resto do tempo era aproveitado ao gosto de cada um. Lia-se, ouvia-se música, jogava-se (muitas vezes a “doer”). Ao fim de três ou quatro dias de viagem a temperatura subiu e a piscina começou a ser muito frequentada.

Além disso conversava-se muito, sobretudo, especulando sobre qual seria a zona de Angola que nos esperava.

Aliás, este era um tema recorrente na 2ª classe, entre os camaradas dos três batalhões que seguiam a bordo. Sabiamos que havia três destinos: Zala, o mais perigoso de todos e talvez a mais perigosa zona do Norte de Angola, Vale do Loge, e salvo erro, o terceiro era Ambriz.

Como o comandante do nosso Batalhão tinha vindo de Zala, onde era segundo comandante do Batalhão que ia ser substituido, os camaradas dos outros Batalhões achavam que seria esse o nosso destino. Em boa verdade, também nós, no BART 741, achávamos que talvez a teoria fizesse sentido e receávamos (muito) que a previsão se concretizasse.
Momentos de descontracção...

Um ou dois dias antes da chegada, ficámos a saber, com enorme alívio (mesmo não tendo qualquer informação sobre o que nos esperava nos locais de destino), que o comando do nosso Batalhão ficaria colocado no antigo colonato do Vale do Loge, com as companhias distribuídas por Lucunga (738), Toto (739) e Serra da Inga (740).

A chegada a Luanda não foi um dia particularmente feliz para a generalidade dos contingentes que iam desembarcar. Alguns - poucos - praças da minha Companhia choravam, desolados, contemplando as barrocas de terra vermelha e queixando-se igualmente do calor e da humidade que se fazia sentir. Dávamos, quase todos, um enorme “salto” no desconhecido, com pouco mais de 20 inexperientes anos.
Luanda - O porto
O estado de espírito não melhorou quando vimos o meio de transporte que nos levaria do porto de Luanda até ao quartel, no Grafanil, onde as unidades permaneceriam até à partida para o Norte. Tratava-se de um longo combóio, tendo apenas meia dúzia de carruagens de passageiros, sendo a restante composição constituida por vagões de mercadorias, fechados, com uma larga porta de cada lado, onde viajámos um pouco em condições semelhantes às do gado. O trajecto foi feito através de muceques onde a miséria era evidente, o que também não ajudou a melhorar a situação. Nestas circunstâncias, o moral não era particularmente elevado quando, chegados ao Grafanil, saltámos dos vagões para o terreno arenoso.

Depois de formados, desfilámos ao longo do quartel. Nessa manhã, a minha Companhia deve ter proporcionado ao capitão Rubi Marques, o que terá sido talvez a maior contrariedade que teve com o pessoal durante todo o ano que permaneceu connosco.

Durante o tempo de instrução no antigo RAL 1 fomos treinando, por sua iniciativa, uma espectacular forma de marchar a que ele chamava “ o passo de parada”. Exibimo-lo algumas vezes, a última das quais, durante o desfile no Cais da Rocha Conde d'Óbidos. Só que, no Grafanil, como se tivesse havido combinação, o “passo de parada” não saiu. Apesar das repetidas ordens, o pessoal andava mais do que marchava. O nosso comandante de Companhia, estava mais que descontente; estava furioso.

Mas o pior estava para vir. Não estávamos à espera que os alojamentos fossem luxuosos, mas esperávamos, talvez, ficar instalados em edificações pre-fabricadas. Porém, o que nos saiu para passarmos os cinco dias que ali ficariamos foram pequenas tendas de três panos, para alojar, cada uma, três militares e as respectivas bagagens. Aí ninguém calou o descontentamento. Cumpridor das normas, o capitão Rubi Marques avisou que todos (incluindo ele próprio) ficariam nas tendas.
Sucede que da minha Companhia fazia parte o furriel-miliciano José Rodrigues que, sendo o mais jovem dos sargentos, ia fazer a segunda comissão em Angola (por troca com um camarada), pois tinha assentado praça voluntariamente aos 18 anos. E a sua experiência foi decisiva para um pequeno grupo de que fiz parte, se “desenfiar”, evitando pernoitar nas malfadadas tendas.

Disse-nos o Rodrigues que estavam sempre a sair transportes do Grafanil para Luanda, e vice-versa. Bastaria que fossemos até à porta de armas e tomássemos lugar num desses transportes. Assim fizemos e em Luanda ficámos numa moradia, na Avenida Marechal Carmona, cuja dona ele já conhecia, e que funcionava como pensão de militares.

Nessa primeira noite, foi nosso cicerone. Deitámo-nos tarde, pedindo que nos acordassem às seis horas. Nem tomámos pequeno-almoço. Apanhámos dois táxis e seguimos para o Grafanil, onde aparentemente quem de direito não deu pela nossa falta. É claro que a nossa saída era do conhecimento de alguns. E, embora acabasse por chegar mais acima, não teve consequências.

Os camaradas que lá tinham pernoitado pouco ou nada dormiram. Os mosquitos atacaram em força, deixando as marcas das picadas na maior parte do pessoal. Dentro da minha tenda, que tinha ficado só com a bagagem, havia uma nuvem de mosquitos. Do que nos livrámos...

Nesse dia, e nos seguintes, as ordens foram alteradas. O comandante da Companhia autorizou a dormida em Luanda, excepto, naturalmente, a quem estava de serviço.

E, ao fim da tarde, lá partíamos à descoberta da cidade e à recarga das baterias para a permanência no “mato” ,que nos esperava.

Carlos Fonseca
CArt 738
Luanda - Avenida Marechal Carmona

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sábado, 16 de janeiro de 2010

Tôto - Destacamento de Intendência

No seguimento do nosso postal de 30.Nov.2009, "Escoltas", fomos, como já referimos, agradavelmente surpreendidos pelo contacto, via "mail", do ex-Alf Mil SAM, Emanuel Fronteira, emigrante no Canadá há cerca de 30 anos.

Embora não o referindo expressamente, esteve sempre presente no nosso espírito, desde que iniciámos este trabalho, a possibilidade de encontrarmos alguns camaradas que, por força de determinadas circunstâncias, não mantiveram qualquer vínculo com outros elementos do Batalhão e que, por esse facto, não puderam ainda experimentar as alegrias do reencontro na sempre agradável atmosfera das nossas confraternizações.

Embora poucos, alguns casos vão acontecendo, como o do camarada acima referido, o que, inequivocamente, nos anima a continuar o nosso propósito.

Em "mail" recebido ontem, o Emanuel lamentava, sem dúvida com alguma tristeza, não ter qualquer contacto dos seus antigos soldados, sobretudo daqueles que, com ele, serviram no Tôto. Daí a razão deste pequeno postal em que, publicando uma sua fotografia da época - recorte fotográfico de uma foto de grupo, tirada no aeródromo de manobra do Tôto - o fazemos na esperança de que, alguns deles, a possam ver. Se tal acontecer, o autor do blogue, uma vez contactado, disponibilizará o endereço electrónico do Emanuel.

VETERANO

sábado, 9 de janeiro de 2010

Um Bom Ano Novo de 2010

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Vera Cruz

Partida

Resolvemos encimar este postal com a foto do navio que nos transportou para (e de, também) Angola: o paquete Vera Cruz. Cumpre-se hoje o 45º. aniversário da nossa partida e comemoraremos, dentro de dias, idêntico aniversário relativamente ao desembarque em Luanda. Temos preparado, para esse dia, um postal que nos foi remetido pelo camarada Carlos Fonseca, da CArt738.

Propósito

Terminado o período das festas natalícias, eis-nos regressados à nossa rotina diária. Para já, o blogue, compromisso que assumimos há um ano e que queremos manter enquanto pudermos. Ao mesmo tempo, iniciam-se as preocupações da próxima confraternização, com a selecção do local. Ainda não decidimos. Vamos falar com uns quantos camaradas, residentes por perto, e escolher, depois. Se alguém quiser mandar sugestões, que não hesite.

Emanuel Fronteira

Nos últimos dias de 2009 fomos agradavelmente surpreendidos pelo contacto de um camarada que, não sendo do nosso Bart 741, conviveu, porém, connosco no Tôto. Trata-se do ex-Alferes Emanuel Fronteira, a viver no Canadá desde 1977 e que foi comandante do Destacamento de Intendência. Publicamos, aqui, uma fotografia, que o próprio nos enviou. É o de óculos escuros, que está sentado à esquerda do Dr. Terrinha. Prometemos voltar a referi-lo neste local.

VETERANO