Tôto - Aeródromo de Manobra - 1965
Despedida do Cap Art Fernando Mira
(Agachados, da esquerda para a direita: Santos, Cortes, Salema, Mouga; De pé, da esquerda para a direita: Pontes, Serrador, Ventura, 1º. Sarg Ferreira, Veiga, Cap Mira, 2º. Sarg Vitorino, ?, 2º. Sarg Almeida)
Pelas razões já fartas vezes aqui apontadas conheci o Salema apenas quando cheguei ao Tôto. O Salema tinha-se juntado à CArt 739 por altura da IAO (Instrução de Aperfeiçoamento Operacional), oriundo, presumo eu, da Administração Militar, já que a sua especialidade era a de Vagomestre. E, no exercício desta função seguiu para Angola.
A verdade, porém, é que não possuía qualquer jeito para a Vagomestria. Invejava, disse-mo uma ocasião, os seus camaradas furriéis que, por força da actividade operacional, saíam para o mato, numa frequência esgotante. Por várias vezes pediu ao Comandante da CArt 739 – na altura, o Cap Art Fernando Mira, que o substituísse na função, mas este não se dispunha a ceder, talvez porque as hipóteses de escolha não sobejassem. Entretanto, era tão notório o desinteresse que o Cap Mira teve que render-se à evidência e decidiu substituir o Salema pelo João Mouga (o que se revelou, mais tarde, não ter sido uma escolha particularmente feliz: o Mouga era de Infantaria e pouco ou mesmo nada percebia do assunto) e encaminhou o Salema para o 1º. Grupo de Combate.
Foi, na actividade do seu G.C. que se confirmaram as suas grandes qualidades de militar. Dedicado, empenhado, amigo dos seus soldados, capaz, até, de dar a vida por eles, tinha a atitude do soldado que não só aceita a inevitabilidade da guerra, como entende estar a cumprir um dever patriótico. Sem jamais considerar o risco que corria e vivendo, com particular satisfação – quiçá, mesmo, alegria – as várias aventuras daquela “sua” guerra, exibia um certo tique marialva – o que se lhe perdoava por ser ribatejano de gema – usando, no cano da bota, a sua faca de mato.
Julgo que não haverá quem se não recorde – pelo menos de ouvir dizer – da celebérrima “pega” de uma pacaça, a que o obrigou um animal que investira sobre o Unimog e lhe não dera tempo a nele se refugiar.
Terminada a comissão, enveredou pela vida civil na sua Almeirim natal e, praticamente, esteve presente em todas as nossas confraternizações. Encontrámo-nos pela última vez em 2003, apresentando já os sinais da terrível doença que o consumia. O “nosso Salema”, no carinhoso dizer dos seus ex-soldados, faleceu na semana imediata, quase como se tivesse ido ao convívio para se despedir dos seus camaradas de sempre!
Extracto da O.S. nº. 205, de 22/11/1965, da CArt 739:
Louvo o Furriel Miliciano Francisco Pinto Cardoso da Costa Salema, porque, sentindo-se mal preparado e com poucas qualidades para o bom desempenho das funções da sua especialidade - Vaguemestre - mas desejando ser útil à sua Companhia, se ter oferecido para servir como Atirador, tendo-se revelado desde há cerca de oito meses em que vem desempenhando funções de Comandante de uma Secção de Atiradores, um militar extraordinariamente desembaraçado no comando de tropas, corajoso, sempre voluntário para qualquer missão, mesmo perigosa, e com notável espírito de sacrifício. Alia a estas qualidades o ser um militar muito disciplinado e de esmerada educação cívica, bom camarada, tendo, pelas suas virtudes, merecido a consideração e amizade dos seus subordinados, camaradas e superiores.
(aditado em 26 de Março de 2010)
VETERANO
P.S. – Mesmo numa razoável colecção de fotografias – como é o caso da que possuo – há sempre falhas. No caso presente, a única foto em que o Salema está presente é a do grupo que encima este postal.
PPS – Pese embora ter já pedido ajuda quanto à identificação do nosso camarada (em pé, o 2º. a contar da direita) ninguém – repito: ninguém! – me deu, até agora, qualquer informação. O que é pena!
V.