Teve, por Unidade mobilizadora, o Regimento de Artilharia Ligeira 1, de Lisboa. Constituído por três Companhias operacionais e uma de comando e serviços - C.ART 738, C.ART 739, C.ART 740 e CCS - desembarcou em Luanda no dia 18 de Janeiro de 1965. Regressou à Metrópole em 1967, aportando ao cais da Rocha do Conde de Óbidos a 9 de Março.


domingo, 22 de março de 2009

In Memoriam --- 01- O Palhaço


Chamava-se Artur Dias dos Santos, mas era conhecido por “Palhaço Pequeno” (abreviadamente, o “Palhaço”) se bem me lembro, em virtude de uma frase de que me não recordo, mas que ele e o “Mano” (“Mano do Palhaço”) usavam a propósito de tudo e de nada.
Chegou ao RAL 1, vindo do Regimento de Infantaria 10, de Aveiro, onde fizera a recruta. Os acasos da sorte trouxeram-no ao Pelotão que eu comandava, mais tarde designado por 4º. Grupo de Combate da Cart 739. Foi destinado ao armamento pesado de infantaria, mais propriamente à Secção de metralhadoras pesadas. Iniciou a sua instrução sob a orientação directa do Furriel Miliciano Carlos Ventura, especializando-se na “Breda” que montava e desmontava em tempo recorde.
A reorganização dos diversos Grupos de Combate, acontecida já com a Companhia em acção no Norte de Angola, levou à dispersão das Secções de armamento pesado. Terá sido o Furriel Ventura quem, reconhecendo as suas grandes qualidades de soldado, impediu a sua ida para outro Grupo.
Apesar da sua especialização em metralhadora pesada, o “Palhaço", como qualquer outro soldado, actuava como atirador de infantaria. E era um excelente soldado, fino, silencioso, bom andarilho, bom “pisteiro”, com grande sentido de orientação, sóbrio e, sobretudo, com um espírito de sacrifício enorme. Além disso, gostava daquela guerra, que via, como já referi, uma vez, noutro local, como um filme de “cowboys” de que se sentia protagonista. Adaptava-se, como ninguém, à dureza daquela vida, aceitando, com a filosofia do verdadeiro soldado, a fome, a sede e o cansaço.
Quando, por razões operacionais, se verificava a necessidade de deslocações motorizadas – escoltas, protecção de colunas civis, apoio logístico, etc. – é que tinha possibilidade de usar a sua arma preferida, normalmente presa a um suporte metálico de protecção montado numa das viaturas. Vivia, esses momentos, com especial satisfação, pelo gozo proporcionado pelos tiros daquela arma de excepção.
Viveu, como todos nós, cerca de um ano no Norte de Angola. No Toto, mais precisamente. Substituídos que fomos, seguiu com o 4º. Grupo de Combate para o Mussende. À cabeceira da sua cama de beliche, vi-lhe, por esta altura e pela primeira vez, uma fotografia que exibia sempre com grande orgulho: os seus Pais e o numeroso grupo de filhos “formados”, não por alturas, como na tropa, mas por idades. Ele, salvo erro, era o mais novo daqueles 18 irmãos. Tinha sobrinhos mais velhos do que ele, o que, por qualquer razão só dele conhecida, referia com enorme vaidade.
No Mussende permaneceu algum tempo – não muito – até a Companhia ser colocada como tropa à disposição do Comando do Sector Leste e deslocada para o Lucusse.
Aqui, o "Palhaço" contribuiu com os conhecimentos que possuía da sua arte civil – trolha – para a construção do quartel. Paralelamente continuou a agir como soldado que era, incluído nas missões que os comandos destinavam à sua Companhia e ao seu Grupo de Combate.
O “Palhaço” faleceu em combate no leste de Angola, disparando a MG 42, que lhe havia sido distribuída no início da operação “Luena Grande”, sobre um grupo de assalto inimigo, naquela fatídico fim do dia 18 de Outubro de 1966.
No cemitério da localidade onde nasceu e cresceu – Arcozelo, Vila Nova de Gaia - existe hoje um pequeno memorial que lembra os cinco naturais que , como ele, morreram na Guerra do Ultramar. É um dos meus habituais lugares de meditação, sempre que lá me desloco, o que, frequentemente, acontece. Toda a sua família, tanto quanto sei, emigrou, há já muito tempo, para a África do Sul e a velha casa de seus Pais deu, há muito, lugar a um prédio de andares. 

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